Visão prospectiva da saúde
A Região tem o imperativo de construir sistemas de saúde resilientes e sustentáveis para assegurar a saúde universal e como ferramenta para lidar com as emergências de saúde pública. A governança da saúde precisa ser reforçada para que os países formulem políticas que promovam a saúde e o bem-estar, reduzam as iniquidades de saúde e alcancem o ODS 3. Esta publicação mostra que, embora a maioria dos países da Região tenha buscado uma resposta integral à pandemia, um dos desafios mais importantes foi coordenar essa resposta em um contexto de alta fragmentação do estado e falta de recursos críticos para o sistema de saúde. Tal coordenação dependeu das capacidades políticas e institucionais das autoridades de saúde para liderar um exercício eficaz das funções essenciais de saúde pública.
É necessário promover estratégias pró-sociais que apoiem ações para ajudar indivíduos e comunidades durante as pandemias atuais e futuras, a partir de um enfoque de saúde mental e física, a fim de abordar os efeitos negativos sobre a saúde mental. É importante que, durante as fases de preparação e resposta a qualquer evento que ameace a saúde, a saúde mental faça parte dos planos como um dos pilares fundamentais que contribuem para salvar vidas e proteger a saúde mental das pessoas, com ênfase nos grupos em situação de vulnerabilidade.
A função reitora das autoridades de saúde é uma dimensão política e institucional essencial de qualquer agenda intersetorial para promover sistemas de saúde resilientes. A pandemia evidenciou que é imperativo que os países contem com sistemas de saúde capazes de reagir a futuras emergências de saúde, mas também demonstrou a urgência de fortalecer a resposta aos problemas de saúde prevalecentes. Para enfrentar novas emergências, os países precisam ter planos atualizados e manter suas medidas de resposta para contenção e mitigação em condição operacional. Avançar na Agenda 2030 () e voltar ao caminho de alcançar os ODS para “[a]ssegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades” significa avançar rumo à saúde universal.
Um dos resultados positivos da liderança e governança na Região tem sido a cooperação entre países das Américas – incluindo experiências de cooperação horizontal na América Latina e no Caribe – em prol de um acesso mais equitativo às tecnologias de saúde, como vacinas, equipamentos médicos, EPIs e terapias contra a COVID-19, bem como a cooperação do Canadá e dos Estados Unidos para acelerar o acesso a vacinas e outras tecnologias. Para alcançar uma resposta eficaz em saúde, são necessários mecanismos de coordenação intersetorial e multidimensional que contemplem diferentes condições sociais, a partir de uma perspectiva de toda a sociedade e de todo o governo.
Na Região das Américas – como no resto do mundo – as pessoas em situações de vulnerabilidade têm sido expostas a um maior ônus da pandemia. Os países precisam elaborar estratégias explícitas de ação para reduzir significativamente as lacunas em saúde. São necessárias políticas intersetoriais que promovam a sinergia entre as dimensões de saúde, econômica, social e ambiental, com base no conceito de equidade. Abordar os determinantes sociais da saúde significa ter sistemas de proteção social com universalidade, integralidade e sustentabilidade para promover ações de saúde além das assistenciais e curativas.
Por outro lado, a pandemia revelou o papel central das comunidades e de suas organizações sociais, que foram essenciais tanto para a implementação da resposta quanto para a adesão às recomendações. Seus conhecimentos e experiências tornaram possível adequar e adaptar as ações às realidades e contextos locais. Sistemas de saúde resilientes e sustentáveis devem envolver as comunidades e suas organizações na formulação e implementação de políticas de saúde.
É preciso promover ações multisetoriais a partir de uma abordagem de “Saúde Única” para melhorar a prevenção e a preparação para a COVID-19 e para desafios futuros na interface entre humanos, animais e o meio ambiente. A complexidade da origem da pandemia de COVID-19 destacou a necessidade de abordar a prevenção de futuros patógenos emergentes, já que mais de 70% desses patógenos são zoonóticos. Para se preparar melhor para uma próxima epidemia de doença zoonótica emergente, os sistemas de análise de risco precisam ser melhorados, incorporando dados sobre micro-organismos, animais e cadeias alimentares de origem animal, humanos e o meio ambiente.
Em termos da dimensão tecnológica, o fortalecimento dos sistemas de saúde requer uma aceleração da transformação digital e um fortalecimento dos sistemas de informação para a saúde. Durante a pandemia, surgiram desafios para o monitoramento oportuno devido à escassez de dados abertos, de qualidade e disponíveis em tempo real para a tomada de decisão. Os sistemas de informação devem estar interconectados e on-line, ser interoperáveis, estar em conformidade com as normas internacionais e dispor da desagregação necessária para assegurar resultados equitativos e permitir uma tomada de decisão rápida e o mais bem fundamentada possível, para que ninguém seja deixado para trás. A agenda da transformação digital para o setor da saúde envolve ações holísticas que levam em conta os oito princípios orientadores acordados pelos Estados Membros da OPAS (, ).
É preciso fortalecer os sistemas de vigilância epidemiológica para controlarmos a atual pandemia e nos anteciparmos a futuras pandemias. As ferramentas de inteligência epidemiológica devem fornecer análises em tempo real para a tomada de decisões em diferentes níveis (local, nacional, regional, mundial), de modo que seja possível direcionar as ações de resposta em diferentes lugares e momentos, considerando a magnitude da resposta necessária e identificando os grupos mais vulneráveis da população. Além disso, o acesso a dados “não convencionais” e “não estruturados”, tais como mobilidade populacional, letramento digital, uso de dispositivos móveis ou capacidade de largura de banda para uso de telecomunicações, deve ser considerado fator crítico para o sucesso na tomada de decisões informadas no setor da saúde. A criação de mecanismos como a Rede Regional de Vigilância Genômica da COVID-19 contribuiu não apenas para a capacidade de sequenciamento de vírus, mas também para incentivar os países a implementar a vigilância genômica regular como estratégia para aumentar a quantidade de dados disponíveis mundialmente.
A Região deve se concentrar no aumento das capacidades regionais para o desenvolvimento e produção de medicamentos e outras tecnologias de saúde. A pandemia de COVID-19 gerou desabastecimentos e iniquidades no acesso a produtos farmacêuticos, vacinas e outras tecnologias de saúde essenciais, que cercearam as capacidades de resposta dos sistemas de saúde e limitaram ou colocaram em risco a prestação de serviços essenciais de saúde. O aumento das capacidades regionais para o desenvolvimento e produção de medicamentos e outras tecnologias de saúde pode contribuir para melhorar o acesso e a resposta às prioridades e necessidades de saúde da Região, bem como contribuir para a proteção da segurança nacional e para a recuperação econômica na Região.
A governança, liderança, condições e capacidades dos recursos humanos em saúde da Região precisam ser reforçados, e devem ser elementos-chave para o fortalecimento dos sistemas de saúde. O fortalecimento dos recursos humanos requer parcerias com os principais atores, incluindo o meio acadêmico e o setor privado, entre outros. Deve-se contemplar o desenvolvimento de políticas de formação, recrutamento e retenção de recursos humanos a fim de responder às exigências dos sistemas nacionais, sempre com vistas a alcançar a saúde universal.
A pandemia afetou drasticamente a população global e a população das Américas, com graves consequências econômicas, sociais e de saúde, revelando uma elevada desigualdade social que se soma às deficiências estruturais persistentes nos sistemas de saúde na Região. Apesar disso, a Região foi capaz de fortalecer suas ações de cooperação com base na solidariedade e no pan-americanismo que a caracterizam. Foram demonstrados o valor do investimento na preparação para emergências, o papel central das comunidades e dos processos participativos, a centralidade articuladora do trabalho intersetorial, os sistemas de informação e a capacidade de desenvolvimento da tecnologia da saúde. A OPAS continuará de mãos dadas com seus Estados Membros, promovendo a saúde universal e a equidade em saúde como elemento central para o desenvolvimento.